Autor: suportedamiani

Ex-presidente vira réu nos EUA: e agora?

Pela primeira vez em sua história um ex-presidente norte-americano virou réu numa ação criminal. Donald Trump está sendo processado pelo eventual suborno a três pessoas durante a eleição de 2016. Segundo as acusações, os indivíduos teriam recebido dinheiro do ex-presidente, por intermédio de seu advogado, para acobertar supostos relacionamentos extraconjugais, cuja publicidade traria prejuízo à corrida presidencial.

Ainda, segundo a acusação, o suborno para se manter sigilo fora lançado como “despesas jurídicas”, uma vez que os gastos foram reembolsados ao advogado intermediador, durante a prestação de contas da campanha. Esse fato pode tipificar o crime de falsificação de registros, segundo a Lei americana.

Nesta semana, o Republicano ficou frente a frente com a justiça e ouviu formalmente a denúncia pela qual responderá, oportunidade em que se declarou inocente das acusações.

Traçando um paralelo com o sistema penal brasileiro, o ato seria o equivalente à decisão de recebimento da denúncia, fazendo com que o cidadão deixe figurar apenas como investigado e passe a figurar como réu, marcando o início da Ação Penal.

Mas afinal, diante de tal situação, poderá Donald Trump concorrer à Casa Branca nas próximas eleições?

A resposta é positiva. A Constituição norte-americana não prevê qualquer óbice a candidatura de réu em processo criminal, bem como é permitido que o ex-presidente concorra até mesmo em caso de uma eventual condenação, uma vez que o direito segue a lógica de que é permitido tudo aquilo que não é expressamente proibido.

Diferentemente, o Brasil proíbe a candidatura de cidadãos condenados em segunda instância, como ocorreu no caso do Presidente Lula, com fundamento na chamada Lei da Ficha Limpa.

Fato é que o ex-presidente Donald Trump continuará sendo forte candidato na corrida presidencial americana. Muito embora o povo de Nova Iorque, integrantes do tribunal do júri que julgará o Republicano, tenha o poder de decidir se o ex-presidente é culpado ou inocente, a derradeira sentença acerca da trajetória política de Trump, muito provavelmente, será proferida nas próximas eleições. 

STF derruba prisão especial a quem tem diploma

 O sócio fundador André Damiani foi destaque no Jornal Poder360

O STF (Supremo Tribunal Federal) derrubou por unanimidade a possibilidade de prisão especial a detidos com curso superior. O julgamento é realizado em plenário virtual e se encerra nesta 6ª feira (31.mar.2023). O relator, ministro Alexandre de Moraes, considerou que a medida é “inconciliável” com o princípio da isonomia.

Para Moraes, a prisão especial funciona como uma “medida estatal discriminatória” que reforça desigualdades. Ele considera que existe um “tratamento inequivocadamente diferenciado” na modalidade e que a concessão do direito a portadores de diplomas é uma “verdadeira ‘jabuticaba’ brasileira“. Eis a íntegra (177 KB) do voto de Moraes.

Apenas o fato de a cela em separado não estar superlotada já é circunstância que, por si só, acarreta melhores condições de recolhimento aos beneficiários desse direito, quando comparadas aos espaços atribuídos à população carcerária no geral – que, como se sabe, consiste em um problema gravíssimo em nosso país, podendo extrapolar em até 4 vezes o número de vagas disponíveis“, afirma Moraes.

Segundo Moraes, “ao permitir-se um tratamento especial por parte do Estado dispensado aos bacharéis presos cautelarmente, a legislação beneficia justamente aqueles que já são mais favorecidos socialmente, os quais já obtiveram um privilégio inequívoco de acesso a uma universidade”.

Esse benefício apenas transpõe para o sistema carcerário a mesma e intolerável divisão social desigual, injusta, discriminatória e aristocrata ainda hoje existente no seio da sociedade brasileira“, completou. A medida é concedida apenas em casos de prisão provisória e preventiva.

Moraes destacou haver regras na Constituição e no CPP (Código de Processo Penal) para tratamentos diferenciados no ambiente carcerário para evitar, por exemplo, a prática de violência. Assim, são separados, nos presídios, homens de mulheres; crianças e adolescentes que cometeram atos infracionais; autores de crimes mais graves; e presos definitivos dos provisórios.

A ação, apresentada em 2015 pela PGR (Procuradoria Geral da República) ao STF, já havia sido levada a julgamento virtual em novembro de 2022. As ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber e o ministro Edson Fachin haviam acompanhado o posicionamento de Moraes quando Dias Toffoli pediu vista (mais tempo para análise).

No julgamento atual, Toffoli seguiu o posicionamento de Moraes, aderindo a uma ressalva apresentada por Fachin –“de que quaisquer presos – aí incluídos também os detentores de diploma de curso superior – podem ser segregados dos demais para a proteção de sua integridade física, moral ou psicológica”, de acordo com a lei de Execução Penal.

Advogados criminalistas se posicionaram favoráveis à decisão. O advogado André Damiani, sócio fundador da Damiani Sociedade de Advogados, considera a prisão especial como uma “aberração jurídica“. “Além de não encontrar guarida na Constituição, revela profunda mazela da sociedade brasileira“, afirma.

Já Daniel Gerber, especializado em Direito Penal Econômico e mestre em Ciências Criminais, sócio do escritório Daniel Gerber Advogados Associados, alega que embora a decisão do STF esteja correta ao considerar uma “diferenciação não permitida” entre os cidadãos, é preciso lembrar da realidade dos presídios brasileiros.

A tristeza, portanto, não diz respeito ao fim da prisão especial, mas, sim, da incapacidade de alcançar aquilo que a Constituição realmente prevê como direitos e garantias de todo cidadão”, diz o advogado.

Leia na íntegra

Apostas esportivas: os riscos e a regulamentação

Lazer, renda extra ou, até mesmo, compulsão. O mercado de apostas esportivas cresce no Brasil e já movimenta uma receita bilionária, fazendo com que o país represente o segundo maior mercado de apostas no mundo; atrás, apenas dos EUA.

 Motivados pela alta lucratividade e a ausência de regulamentações, trapaceiros manipulam resultados dos mais diversos tipos de apostas.

O que antes ocorria nas sombras, hoje acontece no horário nobre. Recentemente, veio à tona um esquema de manipulação de resultados envolvendo times que disputam a Série B do Campeonato Brasileiro de Futebol, ou seja, campeonato de extrema relevância nacional e com significativo número de telespectadores fiéis.

O Ministério Público apurou que um grupo de assediadores teria oferecido dinheiro para que atletas manipulassem os resultados das partidas, como exemplo, praticarem um pênalti até certo minuto do jogo, cederem um número certo de escanteios para a equipe adversária etc.

Em 2018, a Lei 13.756 legalizou a chamada “aposta em quota fixa” que consiste na possibilidade de se apostar na concretização de um resultado específico, como exemplo o número de gols pro ou contra numa partida de futebol, quem chegará primeiro na corrida de cavalo, ou até mesmo, a quantidade de saques que um tenista irá errar durante a partida.

Ocorre que a regulamentação específica prevista na lei nunca aconteceu.

Hoje, as casas de apostas operam de forma livre, sem a previsão de regras específicas quanto aos seus direitos e deveres, como exemplo a obrigação de adotar mecanismos de combate a lavagem de dinheiro, pagamento de impostos, regras de proteção aos consumidores, dentre outros.

Mais do que investigar e responsabilizar os fraudadores, que poderão responder, por exemplo, pelo crime de estelionato, é necessário que o Governo Federal supra essa lacuna e regulamente de uma vez por todas o mercado bilionário de aposta. Inclusive, com a criação de um órgão específico para fiscalização da atividade.

No Brasil, basta prevalecer a regra mundial: tudo que é monetizado é regulamentado!

BBB 23 e o crime de importunação sexual

Dois participantes foram expulsos do reality show porque teriam importunado sexualmente uma competidora do programa. O caso repercutiu e a Delegacia de Atendimento à Mulher de Jacarepaguá (RJ) instaurou inquérito policial para investigar o crime de importunação sexual.

Diante das câmeras e ao vivo para todo o Brasil, um dos participantes passou a mão nas costas da vítima e tocou suas nádegas, a chamada “mão boba”. A mulher repeliu a investida em sinal claro de reprovação. O segundo competidor reforçou a agressão quando “roubou” um beijo da mesma participante, enquanto ela se esquivava e tentava escapar do ataque.

Conforme já sinalizado pelas autoridades competentes, as condutas admitem a tipificação do crime de importunação sexual, que está previsto no artigo 215 – A, do Código Penal, e consiste no ato de “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”, a pena prevista é de 01 a 05 anos de prisão.

Agiu bem o programa ao decidir pela eliminação dos participantes, uma vez que a violência contra mulher não pode servir de entretenimento. 

Em situações como esta, além da eventual punição criminal dos agentes é necessária a adoção de medidas de acolhimento e orientação à vítima.

A crueza das cenas protagonizadas pelos participantes do Reality Show mais assistido do Brasil serve de alerta para a importunação sexual que ocorre habitualmente no transporte coletivo lotado, em filas de banco e durante o expediente. 

A regra é uma só: quando um não quer, dois não se beijam, não se tocam. Tudo que ocorrer contra a vontade do próximo será crime!

Feminicídio: oito anos após aprovação da lei

Com a necessidade de conferir maior proteção as mulheres, em 09 de março de 2015, a Lei n° 13.104 entrou em vigor e alterou o artigo 121 do Código Penal para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, bem como incluí-lo no rol dos crimes hediondos.

Saiba mais sobre o assunto no texto abaixo.  

O que é crime de feminicídio?

Para a configuração do crime de feminicídio, disposto no artigo 121, §2º, inciso VI, do Código Penal, é necessário que o delito seja cometido em razão do gênero, ou seja, matar a mulher por razões da condição do sexo feminino. Considera-se que há razões da condição de sexo feminino, nos termos do §2º-A do mesmo dispositivo legal, quando o crime envolve violência doméstica e familiar e/ou menosprezo, ou discriminação à condição de mulher.

A primeira hipótese é aplicada quando o autor do crime é um familiar da vítima ou já manteve algum tipo de laço afetivo com ela. Já a segunda, é manifestada pela misoginia e pela objetificação da mulher, sendo o autor conhecido ou não da vítima. 

É dizer: matar a mulher porque se sente mais forte. Matar a mulher porque acha que ela o traiu. Matar a mulher porque quer se livrar do relacionamento. Matar a mulher porque é extremamente ciumento. 

Nesse ponto, vale dizer que num relacionamento homossexual, por exemplo, o agente do crime pode ser outra mulher. A mulher “mais forte” mata a outra mulher porque ela é a parte mais “fraca” do relacionamento. Observa-se que, neste caso, a mulher que matou não o fez porque a vítima é do sexo feminino, mas sim porque o relacionamento deteriorou-se, por ciúmes etc.  

Leia também: Não se calem: violência obstétrica é crime

Qual é a pena para o crime de feminicídio? 

A pena para o feminicídio é de reclusão de 12 a 30 anos, podendo aumentar de um terço até a metade se o crime for praticado nas seguintes hipóteses: (i) durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; (II) contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou com doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental; (III) na presença física ou virtual de descendente, ou de ascendente da vítima;  (IV)  em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.

Ressalta-se, ainda, que pode haver controvérsia e debate na aplicação da qualificadora, ou seja, se comprovado que a vítima (mulher) não se encontrava em condição de inferioridade, sob nenhum prisma, não há razões para se aplicar a qualificadora. 

Evidentemente que a inserção da qualificadora do feminicídio e a inclusão deste no rol de crimes hediondos, que hoje faz 08 anos desde a sua entrada em vigor, é um grande avanço. 

Conheça a Lei de proteção a mulheres. 

É preciso avançar

No entanto, é notório que a promulgação da referida Lei n° 13.104/2015 não é suficiente para combater a violência e as agressões que as mulheres sofrem apenas pela condição do sexo feminino, sendo imprescindível a adoção de políticas públicas efetivas, seja para a promover a mudança cultural, seja para incentivar as mulheres que se sintam em situação de risco a buscar ajuda das autoridades. Nas palavras de Hillary Clinton: “Os direitos humanos são os direitos das mulheres e os direitos das mulheres são direitos humanos.”

Direitos e deveres de quem viaja para o exterior com dinheiro vivo ou joias

O episódio em que a comitiva do ex-presidente Jair Bolsonaro buscou ingressar no país com joias de valor milionário serve de contexto para discutir a questão alfandegária, quais são os nossos direitos e as nossas obrigações.

O Governo Brasileiro, na figura de Receita Federal, impõe limites para a entrada e saída de dinheiro, bens, produtos, dentre outros itens com valor econômico. Hoje, por exemplo, um cidadão pode entrar ou sair do país levando consigo o equivalente a U$ 10.000,00, aproximadamente, R$ 52.000,00 mil reais.

Já em relação a compra de produtos no exterior, a Receita Federal isentou bens de uso pessoal. Todos demais, a exemplo de joias, devem obedecer ao limite total de US$ 1 mil, ou seja, cerca de R$ 5mil e 200 reais.

Caso o cidadão seja parado pelas autoridades alfandegárias, deverá o indivíduo apresentar a nota fiscal de cada mercadoria não considerada para uso pessoal, ficando suscetível a tributação de importação sobre o valor excedente.

Ainda, em relação a objetos de alto valor agregado, como exemplo, joias, poderá a Receita Federal solicitar ao cidadão esclarecimentos acerca da origem do bem, ficando o indivíduo obrigado a comprovar a propriedade.

O cidadão que descumprir a legislação poderá responder criminalmente pelo fato, uma vez que o artigo 334 do Código Penal prevê o crime de descaminho para aquele que “Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria”, reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

Sendo assim, deve o cidadão tomar alguns cuidados na hora de viajar, ficando atento aos limites impostos pelo governo brasileiro, bem como estar sempre preparado para prestar os devidos esclarecimentos e comprovar a origem lícita de seus bens às autoridades competentes.

STF julga norma sobre visita íntima em presídios federais nesta quarta

O advogado e sócio André Damiani foi destaque no portal R7

Os ministros do Supremo Tribunal Federal devem julgar nesta quarta-feira (8) uma ação que questiona trechos de uma norma, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que criou regras para permitir visitas íntimas em presídios de segurança máxima. Ao redor do mundo (veja exemplos mais abaixo), a Justiça de outros países se divide em permitir ou não a seus detentos que tenham direito a encontros reservados.

Os ministros vão analisar uma ação apresentada pelo Instituto Anjos da Liberdade e pela Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim). De acordo com o texto da norma, a visita conjugal fica restrita à comprovação de casamento ou união estável entre as partes, ou por meio de uma declaração firmada pelo casal.

Também não é admitido mais de um cadastro de pessoas autorizadas para a visita conjugal. A substituição da pessoa cadastrada deve observar o prazo mínimo de 12 meses, contados a partir da indicação de cancelamento do cadastro anterior.

Desde janeiro deste ano, visitas íntimas estão proibidas no sistema prisional em Goiás. Foi promulgada uma lei que veta esse tipo de encontro entre presos e pessoas de fora da cadeia sob a justificativa de que representa um risco à segurança pública. 

Como é pelo mundo

• Irã, Arábia Saudita e Israel: prisioneiros casados têm permissão de receber visitas de esposas.
• México: permite as visitas íntimas entre pessoas do mesmo sexo.
• Canadá: o sistema de visitas íntimas acontece a cada dois meses; os prisioneiros recebem o direito de passar 72 horas com suas esposas e seus familiares em um apartamento mantido pelo sistema prisional.
• Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte: não permitem visitas conjugais nas prisões, mas os detentos de baixo risco podem receber licenças para ir em casa ver os familiares.
• Estados Unidos: o privilégio existe apenas em quatro estados (Washington, Califórnia, Nova York e Connecticut) e em cadeias estaduais; o contato em presídios de segurança máxima só é feito por meio de divisória e telefone.

Juristas têm opiniões diferentes

A norma do Ministério da Justiça e Segurança Pública que limita o acesso de pessoas à visita íntima em presídios federais divide a opinião de juristas. Nessas penitenciárias há presos considerados mais perigosos, e a vigilância é diferenciada. Para o criminalista Adriano Alves, o ponto que talvez apresente maior prejuízo legal ao preso é o condicionamento ao bom comportamento para possibilitar a visita, mas ele concorda com a parte da comprovação conjugal.

A questão da comprovação documental da relação conjugal faz todo sentido, para dar certo controle ao sistema prisional. Caso não haja um controle mínimo documental para visita íntima, seria impossível realizar um controle, possibilitando, inclusive, a organização de atividades ilegais. ADRIANO ALVES, CRIMINALISTA

Para a criminalista Mariana Monteiro de Castro, a resolução do ministério se mostra adequada às diretrizes das Regras de Mandela e Bangkok, dos precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos e da Corte Europeia de Direitos Humanos.

“A norma afirma que, retirando-se os vínculos familiares dos presos, esvaem-se também quaisquer perspectivas de ressocialização dos detentos. É dever do Estado proporcionar a preservação dos vínculos familiares, sendo que o direito à família, os princípios constitucionais da reintegração do preso à sociedade e o direito à visita íntima consolidam tal dever”, disse.

Para o especialista em direito penal Rodrigo Barbosa, a portaria é absolutamente inconstitucional e viola não apenas garantias constitucionais, mas também diversos tratados internacionais de direitos humanos. “O que o Ministério da Justiça tentou fazer é criar um tipo de pena não previsto no ordenamento jurídico”, afirma.

Especialista em direito penal econômico, André Damiani afirma que os trechos que regulamentam a visita íntima no interior das penitenciárias federais violam frontalmente princípios constitucionais, entre os quais o da dignidade da pessoa humana.

“A Constituição assegura ao cidadão preso a assistência da família, e a Lei de Execução Penal prevê, entre os direitos do preso, a visita do cônjuge ou companheiro”, afirma.

Leia na íntegra

É crime inflacionar o preço da água em meio a tragédia no litoral de SP? 

Ganhou repercussão nacional o aumento exorbitante do valor das mercadorias comercializadas no litoral norte de São Paulo, logo após a região haver sido atingida severamente pelas fortes chuvas de fevereiro de 2023; contabilizando-se 65 pessoas mortas.

Não é crime o comerciante vender o litro da água ao preço de R$ 100,00. Mas o tema merece uma reflexão sobre a ótica da moral e da lei.

Segundo a lógica do capitalismo, em princípio, pode o comerciante atribuir a sua mercadoria o valor que bem entender, vigorando a lei da oferta e da procura, ou seja, quanto maior a escassez do produto no mercado, maior será o preço da mercadoria. 

Ocorre que numa situação emergencial, com a população ilhada e à mercê da boa vontade do poder público, não vigora o livre mercado porque os cidadãos são obrigados a consumir gêneros de primeira necessidade (água, alimento, higiene pessoal etc.); compradores coagidos não tem liberdade…

Bem por isso, o Estado não só pode como deve intervir no combate ao superfaturamento dos produtos, afinal, é obrigação do Poder Público assegurar aos indivíduos, severamente afetados pela tragédia ocorrida na região, o acesso regular e justo aos produtos necessários para a sua sobrevivência.

Evidente que não se deve menosprezar o empenho do comerciante que, diante da tragédia ocorrida, se dispõe, pelos próprios meios e riscos, a levar mercadorias para região, podendo sim haver uma certa valorização da mercadoria em razão do esforço e custo para o transporte do produto. 

No entanto, isso não representa “carta branca” para comerciantes, locais ou de fora da região, lucrarem de forma inescrupulosa em face da vulnerabilidade dos cidadãos.

Em síntese, muito embora não possamos falar em crime, o Estado deve atuar com base no Código de Defesa do Consumidor, que garante ao cidadão a proteção contra toda e qualquer prática abusiva, nos termos de seu artigo 6, inciso IV. 

De mais a mais, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 39, inciso X, considera prática abusiva “elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços”, ainda mais diante de uma calamidade pública.

Em tempos de crise, fica a mensagem: precisamos enquanto sociedade nos unir, afinal, como bem disse o escritor Franz Kafka: “A solidariedade é o sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana”.

A tragédia Yanomami e a melhor resposta possível do Direito Penal

 Os advogados André Damiani e Vinícius Fochi foram destaques no Estadão

No Direito Criminal, quem tudo quer geralmente nada alcança. Ao norte do país, mais precisamente entre os estados do Amazonas e Roraima, habita o povo Yanomami, que sofre há anos com o avanço desenfreado do garimpo ilegal na região.

Para além da destruição florestal e poluição dos rios, principais fontes de subsistência da população local, o povo indígena é alvo de crimes bárbaros: homicídio, tortura, estupro de crianças, exploração sexual infantil, dentre outras atrocidades.

Como parte da resposta, o atual ministro da Justiça e Segurança Pública determinou que a Polícia Federal apure suposto crime de genocídio e omissão de socorro.

Ocorre que a imputação pelo crime de genocídio é de comprovação trabalhosa, em que pese este rótulo fomentar generosa repercussão nacional e internacional. Nessa modalidade, entretanto, há risco efetivo de que a maioria dos responsáveis nunca seja alcançada pelo Direito Penal.

De saída, para tipificação do crime de genocídio é necessário comprovar que o agente agiu com o dolo específico de “destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso”, nos termos do artigo 1º, da Lei 2.889/1956.

Além disso, é preciso demonstrar a perfeita causalidade entre a conduta do agente, comissiva ou omissiva, e o resultado. No caso da omissão, se faz necessário, ainda, identificar um dever legal atribuível ao delinquente, cujo desrespeito ensejou o resultado criminoso.

Bem por isso, considerando as informações já coletadas e a constatação de que o Poder Público dispõe de minguados recursos para a elucidação dessa tragédia, parece central a escolha da estratégia mais eficaz: os órgãos de persecução devem focar na responsabilização dos crimes de comprovação mais óbvia, tais como o garimpo ilegal, porte ilegal de arma de fogo, homicídio, estupro, dentre outros, transmitindo uma resposta célere à sociedade e, principalmente, ao povo Yanomami.

Aliás, a título de comparação, a pena de cadeia prevista para o crime de genocídio, na modalidade “matar membros do grupo”, é a mesma prevista para o crime de homicídio qualificado, ou seja, reclusão, de 12 a 30 anos.

Nada contra a apuração concomitante dos crimes de genocídio e de omissão de socorro. Todavia, no curto prazo, esta não deve ser a prioridade acusatória, uma vez que o genocídio do povo Yanomami será provado, com muita sorte e diligência, apenas contra uma pequena parcela dos criminosos.

Uma breve leitura das mais recentes e sangrentas páginas da História mundial reforça a necessidade de uma abordagem objetiva e pragmática. O genocídio ocorrido em Ruanda, em 1994, serve como alerta. No episódio, cerca de 800 mil pessoas foram massacradas em apenas 100 dias.

Buscando-se responsabilizações, o Conselho de Segurança das Nações Unidas, por meio da Resolução 955, criou o Tribunal Penal Internacional para Ruanda, cuja competência abarcava, dentre outros delitos, o julgamento pelo crime de genocídio. Durante quase 21 anos de funcionamento (1994-2015) do Tribunal, 93 pessoas foram indiciadas pelos fatos ocorridos em Ruanda, mas apenas 61 foram condenadas.

Mesmo havendo condenações perante outras Cortes — a execução pública de 22 pessoas em Ruanda é prova disso — o número de responsabilizados pelo episódio é inexpressivo quando comparado à magnitude dos fatos criminosos sobejamente comprovados no assassinato de quase um milhão de pessoas.

Não bastasse o número irrisório de condenados, os julgamentos prolongaram-se por décadas; tudo a fortalecer o sentimento de injustiça e impunidade.

Para driblar semelhante destino, deve-se escolher com técnica a utilização racional do arcabouço jurídico disponível, levando-se em conta os efeitos sempre negativos da prestação jurisdicional tardia.

Fato é que o manejo do Direito Penal jamais poderá renegar a segundo plano uma análise estratégica quanto à eficiência probatória da acusação, sob pena de permitir a impunidade de centenas, talvez milhares, de infratores. Vale lembrar que, muitas das vezes, um “arroz com feijão bem-feito vende mais que caviar”.

*André Damiani, sócio-fundador do Damiani Sociedade de Advogados, é especialista em Direito Penal Econômico e LGPD

*Vinícius Fochi é advogado criminalista no Damiani Sociedade de Advogados

Cadê os R$ 20 bilhões que estavam aqui?

Os advogados André Damiani e Diego Henrique foram destaques no portal Monitor do Mercado

O início do ano de 2023 para o mercado financeiro brasileiro foi marcado por um fato histórico e inédito: a Americanas, uma das maiores varejistas do país, anunciou uma “inconsistência” contábil que ocultava, até então, um prejuízo aproximado de R$ 20 bilhões. Em poucos dias as ações da empresa listada em bolsa “derreteram” e a companhia perdeu quase 80% do seu valor de mercado. Pouco tempo depois a Americanas entrou com pedido de Recuperação Judicial.

Sob o aspecto econômico-financeiro, as consequências são devastadoras. E sob o aspecto jurídico-penal?

De um lado, tem-se falado de maneira bastante genérica em potencial fraude perpetrada pelos administradores da gigante varejista. De outro, é sabido que a CVM instaurou processo administrativo para investigar a ocorrência de “insider trading”, prática que configura tanto ilícito administrativo quanto penal.

Nesse sentido, o art. 27-D da Lei nº 6.385/79 comina pena de um a cinco anos de reclusão e multa de até três vezes o montante da vantagem ilícita obtida, para quem utilizar informação relevante de que tenha conhecimento, ainda não divulgada ao mercado, que seja capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiros, de valores mobiliários.

Ainda, incorre na mesma pena quem repassa informação sigilosa relativa a fato relevante a que tenha tido acesso em razão de cargo ou posição que ocupe em emissor de valores mobiliários ou em razão de relação comercial, profissional ou de confiança com o emissor. Bem por isso, o insider trading é prática desleal que pode colocar em risco o bom funcionamento da Bolsa de Valores.

Trocando em miúdos, o delito acontece quando alguém toma conhecimento de algum fato relevante antes de todo mundo, e se vale desta informação para negociar ativos no mercado e lucrar de maneira indevida. Isto porque, o insider consegue antecipar os movimentos do mercado com informações ainda desconhecidas do público, por exemplo, comprando antecipadamente uma ação cujo preço irá disparar quando a tal notícia relevante vier a público.
No caso da Americanas constatou-se que a quantidade de operações apostando na queda das ações da varejista (short) logo antes da divulgação do fato relevante que atordoou o mercado (a inconsistência contábil na ordem de R$ 20 bilhões), ocorrera em patamares muito elevados, dando indícios de que alguém já sabia da contaminação dos papéis.

Além disso, outras operações envolvendo as ações da Americanas (opções de venda e de compra) ocorridas pouco antes do fechamento do pregão que antecedeu a divulgação da “inconsistência” também chamaram a atenção de especialistas por um volume de movimentação anormal, muito acima da média.

Nesse cenário de operações atípicas, os próprios diretores da empresa já vinham há alguns meses vendendo sistematicamente os papéis da companhia, chegando a um total de mais de R$ 200 milhões em operações deste tipo desde o último semestre, comportamento este que, se comprovado, pode se constituir em indício de práticas criminosas diversas.

Nesse particular, não é raro que práticas contábeis pouco ortodoxas no âmbito empresarial acabem por sair do controle e configurar delitos variados ou, pior, sejam essas, na verdade, uma tentativa de maquiar os crimes perpetrados de forma deliberada.

De uma forma ou de outra, os ilícitos vão desde uma simples falsidade documental à famigerada lavagem de dinheiro, passando por crimes falimentares, contra o sistema financeiro e contra a ordem tributária, com penas que vão de um até dez anos de prisão de forma cumulativa, ou seja, somando-se a pena de cada crime cometido.

Dito isso, é preciso ressaltar que erros de contabilidade não configuram qualquer ilícito penal per si. Contudo, “inconsistências contábeis” no montante de R$ 20 bilhões carregam uma infinidade de questões a serem respondidas e, certamente, não foi o gato que comeu essa dinheirama.

*André Damiani, especialista em Direito Penal Econômico, sócio fundador do Damiani Sociedade de Advogados

**Diego Henrique, advogado criminalista, sócio do Damiani Sociedade de Advogados

Leia na íntegra

Scroll to top