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BBB 23 e o crime de importunação sexual

Dois participantes foram expulsos do reality show porque teriam importunado sexualmente uma competidora do programa. O caso repercutiu e a Delegacia de Atendimento à Mulher de Jacarepaguá (RJ) instaurou inquérito policial para investigar o crime de importunação sexual.

Diante das câmeras e ao vivo para todo o Brasil, um dos participantes passou a mão nas costas da vítima e tocou suas nádegas, a chamada “mão boba”. A mulher repeliu a investida em sinal claro de reprovação. O segundo competidor reforçou a agressão quando “roubou” um beijo da mesma participante, enquanto ela se esquivava e tentava escapar do ataque.

Conforme já sinalizado pelas autoridades competentes, as condutas admitem a tipificação do crime de importunação sexual, que está previsto no artigo 215 – A, do Código Penal, e consiste no ato de “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”, a pena prevista é de 01 a 05 anos de prisão.

Agiu bem o programa ao decidir pela eliminação dos participantes, uma vez que a violência contra mulher não pode servir de entretenimento. 

Em situações como esta, além da eventual punição criminal dos agentes é necessária a adoção de medidas de acolhimento e orientação à vítima.

A crueza das cenas protagonizadas pelos participantes do Reality Show mais assistido do Brasil serve de alerta para a importunação sexual que ocorre habitualmente no transporte coletivo lotado, em filas de banco e durante o expediente. 

A regra é uma só: quando um não quer, dois não se beijam, não se tocam. Tudo que ocorrer contra a vontade do próximo será crime!

Reação a invasão `bolsonarista` em Brasília é mais severa que resposta contra `trumpistas` no Capitólio

O sócio Diego Henrique foi destaque no RTP Notícias, de Portugal

Um mês após `bolsonaristas` atacarem a capital do Brasil, procurando concretizar um golpe de Estado contra o Presidente Lula da Silva, as reações das autoridades brasileiras têm sido mais severas do que as respostas dadas aos invasores do Capitólio nos Estados Unidos.

Segundo quatro advogados criminalistas consultados pela Lusa, embora Brasil e Estados Unidos tenham sistemas de justiça distintos, no país sul-americano a reação aos ataques realizados pelo apoiantes do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro que em 08 de janeiro está a ser mais rápida do que a reação da justiça norte-americana à invasão do Congresso promovida por seguidores do ex-presidente Donald Trump.

“As medidas aqui tiveram que ser mais contundentes e fortes [no Brasil] porque enquanto nos Estados Unidos nunca houve um golpe de Estado, culturalmente isto é inadmissível, aqui no Brasil nós temos uma história de golpes de Estado,” explicou Fernando Augusto Fernandes, advogado criminalista e cientista político.

“Fora isso, houve [no Brasil] a possibilidade de corrosão das instituições, que foi muito mais grave”, acrescentou.

O advogado criminal Conrado Gontijo concorda com a decisão do Governo brasileiro de fazer uma intervenção no sistema de segurança do Distrito Federal e o afastamento do governador do mesmo estado, Ibaneis Rocha, determinado pelo Supremo Tribunal Federal, somados às investigações da Polícia Federal.

“As autoridades públicas incumbidas da responsabilização dessas pessoas também agiram e vêm agindo de forma bastante firme. A Polícia Federal, no dia seguinte, efetuou diversas prisões e vem ainda durante esses últimos dias, realizando diligências de investigação para identificar outras pessoas que participaram dos ataques dos atos de destruição, mas que não foram presos naquela ocasião”, frisou Gontijo.

“Ao longo dos últimos dias, temos observado a realização de diversas etapas de uma operação [da Polícia Federal] batizada de Lesa Pátria no âmbito da qual essas pessoas têm sido presas, identificadas. Há também uma preocupação muito grande de identificação dos financiadores, dos patrocinadores desses atos (…) no plano criminal, a Justiça tem funcionado de forma bastante célere e eficiente”, acrescentou.

O Supremo Tribunal Federal (STF), que teve sua sede vandalizada pelos `bolsonaristas` assim como a Presidência e o Congresso brasileiro informou, num balanço final divulgado em 20 de janeiro, que realizou 1.459 atas de audiência relativas a 1.406 apoiantes do ex-presidente que foram presos em Brasília depois dos atos de 08 de janeiro.

No total, 942 presos tiveram a detenção em flagrante convertida em prisão preventiva e 464 vão responder ao processo em liberdade.

Dois dias depois dos ataques, a Polícia Federal brasileira libertou cerca de 600 pessoas presas (mulheres, crianças e idosos) acusadas de participarem nos atos antidemocráticos.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) brasileira informou no sábado que pelo menos 653 suspeitos de participarem dos atos em 08 de janeiro já foram denunciados à Justiça.

Segundo um balanço divulgado pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, mais de 950 pessoas, das mais de três mil apoiantes do ex-presidente Donald Trump foram presas desde a invasão do Capitólio ocorrida em 06 de janeiro de 2021.

 Deste total, 350 pessoas foram sentenciadas, e quase 200 receberam penas de prisão. Além disso, 484 participantes no ataque a sede do Congresso norte-americano admitiram culpa e iniciaram acordos judiciais, algo que não sucedeu no Brasil, segundo o criminalista Diego Henrique.

“Pelo que eu tive notícia o Ministério Público Federal através da Procuradoria-Geral da República não está oferecendo acordo de não persecução penal [confessar crime em troca de atenuar a pena] sob a justificativa de que não se pode tergiversar sobre crime de tamanha gravidade porque [os bolsonaristas] atentaram contra um bem jurídico muito importante, que é a estabilidade do Estado Democrático de Direito”, contou.

Henrique também lembrou que a Polícia Federal brasileira tem feito as investigações para identificar essas pessoas envolvidas nos ataques, que a Procuradoria-Geral da República criou um grupo especializado dedicado.

“O Poder Judiciário tem tomado as decisões sobre o caso sempre que provocado. Então, essas declarações de operação têm sido feitas medidas de busca e apreensão, decretação de prisões preventivas. A resposta do sistema punitivo foi muito eficiente”, avaliou o advogado.

“Nos Estados Unidos eu tenho a impressão, aqui, já fazendo paralelo, de que a situação foi parecida. Lá há um contingente maior de pessoas que estão respondendo a procedimentos criminais porque os factos são mais antigos e houve maior tempo para investigação e identificação dessas pessoas. Aqui [no Brasil] acho que o caminho será similar. Há ainda um processo de investigação em curso para que a maior quantidade possível desses criminosos seja identificada e, a partir disso, o processo deve tramitar de forma regular, respeitados os direitos de todas essas pessoas ao devido processo legal ou ampla defesa”, completou.

Segundo uma sondagem divulgada no começo de fevereiro pelo Poder Data, que ouviu 2.500 pessoa, mais da metade dos entrevistados (53%) considerou que a prisão dos `bolsonaristas` que participaram das manifestações em Brasília foi certa.

 Para 31%, só as prisões daqueles que foram identificados praticando vandalismo durante os atos de 8 de Janeiro foram corretas, 12% alegaram não saber responder enquanto 4% disseram que as prisões foram erradas.

Embora a maior parte da opinião pública e grande parte dos juristas interpretem a resposta das autoridades brasileiras aos ataques como severa, mas correta, também há no meio jurídico críticas às prisões dos `bolsonaristas` que participaram dos atos de 08 de janeiro.

A advogada constitucionalista Vera Chemin também considera que houve excesso nas prisões, tendo em conta o pouco tempo de investigação, e não é ainda possível se todos os detidos estiveram diretamente envolvidos no vandalismo de espaços públicos, porque as prisões foram feitas um dia depois dos ataques.

A advogada considerou que o movimento `bolsonarista` exercia seu direito a liberdade de reunião e expressão quando estavam na frente do quartel de forma pacífico sem enfrentar oposição clara do Exército até os ataques em Brasília.

“Nos Estados Unidos [após invasão do Capitólio] as pessoas que foram indiciadas e que já foram até sentenciadas foram obviamente enquadradas em determinados crimes por meio de vídeos que comprovaram quem cometeu ato ilícito, quais eram estas pessoas, se cometeram atos de violência (…) No Brasil os vídeos da mesma maneira comprovam quem ou quais foram aquelas pessoas que realmente cometeram atos de violência, quebraram vidros, invadiram prédios, depredaram património publico”, ponderou.

“Estes vídeos, claro, possibilitam investigação, uma futura denúncia e um futuro enquadramento seja [na esfera] civil ou criminal, mas penso que houve um exagero no caso brasileiro (…) aquele exército de pessoas que estavam lá no acampamento foi detido de forma generalizada. Não foram criados critérios seletivos para determinar se todas aquelas pessoas realmente deveriam ser presas em flagrante. Foram confinadas como se fossem uma boida [conjunto de bois] sem qualquer estrutura física de apoio. Esta é a minha restrição”, concluiu a advogada.

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Advogados veem crimes de bolsonaristas contra Estado de Direito e prevaricação de agentes da PRF

O sócio Diego Henrique e o advogado Vinícius Fochi foram destaques no Estadão comentando os bloqueios de rodovias por bolsonaristas.

Os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que bloqueiam rodovias por todo País desde a noite de domingo, 30, logo após a derrota do chefe do Executivo nas urnas, podem ser enquadrados por crimes contra as instituições democráticas, desobediência e incitação ao crime, além de delitos previstos no Código de Trânsito, avaliam advogados consultados pelo Estadão. Eles ponderam que policiais que aderirem aos movimentos ou deixarem de atuar para a liberação das vias podem incorrer em prevaricação e responder juntamente com os manifestantes por ilícitos por estes cometidos.

Em despacho dado nesta terça-feira, 1º, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, alertou sobre a prisão em flagrante daqueles que estiverem praticando ‘crimes contra as instituições democráticas’. A Polícia Rodoviária Federal anunciou, por volta das 10h30, que há 220 bloqueios em 20 Estados e no Distrito Federal.

O advogado Marcos Antonio Nahum, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, argumenta que os apoiadores do presidente podem ter praticado delitos previstos no Código Penal, como paralisação de trabalho de interesse coletivo, impedir ou dificultar o funcionamento de meio de transporte público e incitação ao crime.

O ex-magistrado também vê possíveis crimes de ‘emprego de violência ou grave ameaça à ordem e ao Estado de Direito’. Nahum aponta que os manifestantes podem ser enquadrados por atentado contra a segurança de serviços de utilidade pública como água e luz, além de delitos contra os limites do direito de greve.

Para a criminalista Emanuela de Araújo, a conduta dos bolsonaristas pode caracterizar crimes contra as instituições democráticas e delitos previstos no Código de Trânsito Brasileiro, como obstrução de via pública. Na avaliação da advogada, os apoiadores de Bolsonaro ‘abusam do direito de reunião’, um direito que ‘não pode ser exercido, em uma sociedade democrática, de maneira abusiva e atentatória à proteção dos direitos e liberdades dos demais’.

Avaliação similar é feita pelo advogado Raul Abramo Ariano. Para ele, o comportamento dos responsáveis pelos bloqueios pode ser interpretado como crime de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito – ‘Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais’ – ou como tentativa de depor Estado democraticamente constituído.

Ariano vê possível incidência do crime de desobediência, considerando a ordem do Supremo Tribunal Federal para a liberação de vias.

Na mesma linha, o criminalista Leonardo Magalhães Avelar vê potencial prática de crimes contra o Estado Democrático de Direito nos bloqueios, em razão dos ‘pleitos subversivos’ feitos pelos aliados de Bolsonaro. “Sob o aspecto institucional, o silêncio do Presidente da República é uma grave omissão que legitima e fomenta o movimento ilegal, o que apenas ratifica que ele não possui a estatura necessária ao exercício do cargo”, ressalta ainda Avelar.

Já com relação a policiais que forem flagrados auxiliando manifestantes ou deixando de impedir os bloqueios podem ser enquadrados por prevaricação, indica o criminalista Daniel Gerber. Além disso, o advogado ressalta que os policiais são ‘garantidores, com dever especial de agir’ e assim uma eventual omissão diante de ilícitos praticados por terceiros pode fazer com que os agentes também respondam pelo ilícito em si.

“Além da prevaricação, eles podem responder por todos os crimes praticados pelas pessoas que deveriam ter sido impedidas e não foram, como, por exemplo, crime de dano. Se alguém destruir algo, e o policial que deveria agir e impedir o resultado não o fez, ele responderá pelo dano junto com o manifestante” explica.

Na mesma linha, o criminalista Conrado Gontijo diz que agentes da PRF que aderirem aos movimentos podem incorrer em crime contra as instituições democráticas e desobediência à decisão do STF, que ordenou a desobstrução das rodovias. O mesmo alerta é feito pelos criminalistas Diego Henrique e Vinícius Fochi.

Ainda com relação aos agentes da Polícia Rodoviária Federal, a criminalista Emanuela de Araújo vê possível enquadramento por crime de exercício arbitrário das próprias razões ‘se restar comprovado juridicamente a inércia e omissão’ quanto aos bloqueios.

Consumidor

A advogada e especialista em Direito do Consumidor Renata Abalém considera que há ‘omissão’ na atuação da PRF e entende que se for comprovada responsabilidade da corporação, ‘o governo federal terá de indenizar – material e moralmente – os passageiros aéreos que perderam seus voos, bem como os passageiros terrestres que, de uma forma ou outra, foram prejudicados pela paralisação nas rodovias’.

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Direito Penal de emergência como resultado da pressão midiática

O Direito Penal de emergência é um instrumento autoritário de política criminal que aposta no enrijecimento das leis penais como forma de responder a casos que ganham a atenção da população. 

Como consequência, esses casos acabam causando grande repercussão social, fenômeno este potencializado pela pressão midiática.

Qual é a origem do Direito Penal de emergência? 

Fruto do imediatismo, com objetivo de atender o clamor popular e, por consequência, angariar capital político, o Direito Penal de emergência representa uma grave ameaça a direitos e garantias fundamentais. 

Isso porque as medidas adotadas são desproporcionais, autoritárias e inadequadas ao fim que se propõem, qual seja, a redução da criminalidade.

Em outras palavras, as medidas adotadas têm efeito meramente simbólico, ou seja, atendem à demanda da opinião pública, aplacando os ânimos punitivistas, mas não produzem qualquer resultado útil na real solução do problema.

Exemplos de Direito Penal de emergência no Brasil 

Regime Disciplinar Diferenciado (RDD)

No Brasil, é exemplo do Direito Penal de emergência a criação do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) pela Lei 10.792/03

Essa legislação foi elaborada em resposta à pressão midiática e política que decorreu de rebeliões em presídios em São Paulo e no Rio de Janeiro. 

Assim, o RDD inaugurou uma nova política penitenciária de exceção, marcada pelo confinamento extremo, consolidando-se como uma das formas de pena mais cruéis e degradantes no Brasil.

No entanto, ao contrário do que pensou a opinião pública, fomentada pela mídia, as causas para do problema a serem enfrentadas não eram ausência de legislação ou a previsão de dispositivos brandos. 

A verdadeira causa é a política criminal de encarceramento em massa adotada, que lota nosso sistema carcerário, gerando um “Estado de Coisas Inconstitucional”, como bem reconheceu o Supremo Tribunal Federal (ADPF nº 347/DF).

Dessa forma, ao revés do que pretendeu o legislador emergencista, crise penitenciária brasileira, que representa um problema histórico, não apenas deixou de ser enfrentada como permanece até hoje, agravando-se cada vez mais. 

Isto é, mesmo após quase 20 anos de vigência da lei mais dura, o problema continua sem solução.

Lei dos Crimes Hediondos

Também, não podemos deixar de citar a criação da Lei dos Crimes Hediondos. 

A legislação foi aprovada em caráter de urgência após notícias que causaram comoção social, mas que em nada contribuiu para a diminuição dos crimes violentos. Por exemplo, o caso de sequestro do empresário Abílio Diniz e do publicitário Roberto Medina, no início da década de 90.

Lei Maria da Penha e Lei do Feminicídio

O mesmo se diga a respeito das diversas legislações criadas com a finalidade de conferir maior proteção à mulher. 

A despeito da dos mais de 16 anos de vigência da famigerada Lei Maria da Penha, bem como da recém-criada Lei do Feminicídio, os números da violência de gênero não param de crescer. Ou seja, são exemplos do Direito Penal de emergência. 

Isso ocorre porque o Direito Penal não é instrumento de transformação social. Portanto, não tem aptidão para promover as mudanças estruturais necessárias, seja à redução da criminalidade violenta em uma sociedade desigual, seja à redução da violência de gênero no seio de uma sociedade eminentemente patriarcal.

Assim, o que de fato acontece é que a resposta imediatista promovida pelo Direito Penal de emergência gera uma falsa sensação de resolução da questão. Isso acaba impedindo uma discussão aprofundada do tema em busca de uma solução verdadeira e, por consequência, agravando o problema. 

É como jogar a poeira para baixo do tapete, a casa parece limpa, enquanto, na verdade, a sujeira continua se acumulando.

O futuro do Direito Penal de Emergência 

Na era da tecnologia, essa situação é ainda mais grave, uma vez que a (des)informação trafega de maneira muito veloz e os veículos de comunicação ganham um papel especial na expansão do Direito Penal de emergência. Visto que inflamam a opinião pública com programas e notícias sensacionalistas, pressionando, ainda mais, os Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário).

Não há fórmulas mágicas. O Direito Penal de emergência não pode ser instrumento de política criminal do Estado, na medida em que o mero endurecimento da lei penal não promove o enfrentamento ao problema. 

O Direito Penal deve ser norteado por estudos científicos e não pela ânsia imediatista da opinião pública.

Vinícius Fochi
Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em Direito Penal Econômico pelo Instituto Brasileiro de Ciência Criminais – IBCCRIM

A mudança de paradigma na carreira jurídica: o que querem os jovens advogados?

O sócio fundador André Damiani e o advogado criminalista Vinícius Fochi foram destaques no LexLatin.

No dia a dia da profissão e na prática do direito eles representam pelo menos 15% do total de advogados do país. Prova disso são os dados da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB): do universo de 1,3 milhão profissionais do setor, pelo menos 200 mil possuem menos de 5 anos de carteira da OAB.  

Com o mercado cada vez mais saturado, quem chega agora precisa estar atento às oportunidades ainda inexploradas, às constantes mudanças legislativas e os movimentos políticos e da economia. Na indústria jurídica os profissionais precisam de network e desenvolvimento de uma carteira de clientes. Depender das relações pessoais nem sempre é fácil para um jovem advogado. 

O desenvolvimento de talentos e de futuros sócios é o maior desafio enfrentado por muitos escritórios de advocacia. Dentro desse contexto, uma das principais tarefas dos líderes dessa indústria, principalmente nos escritórios de advocacia não só do Brasil, mas de toda a América Latina, é a criação de uma cultura e sistemas que promovam os jovens profissionais. A pobreza mundial e com a economia ameaçada em várias regiões do planeta?

Mas como fazer isso num ambiente incerto, com entraves políticos, aumento da pobreza mundial e com a economia ameaçada em várias regiões do planeta?

Mesmo com essas dificuldades no horizonte, é preciso entender que muitos desses profissionais serão os líderes da indústria jurídica a partir dos próximos dez, quinze anos. Mas para atingirem o topo da pirâmide, trazendo novos valores típicos de cada geração, eles vão precisar implementar sua cultura, algo que vai ser diferente das premissas para o sucesso profissional de hoje, que trata a carreira como prioridade ou ao menos em pé de igualdade com outros pilares da vida, como família e outras relações. 

Para Larissa Fonseca, uma jovem advogada de 24 anos da área de Processo Civil do GVM Advogados, é preciso valorizar a troca de informações e conhecimentos.

“Permitir criar um ambiente mais flexível, um ambiente onde mais ideias circulem, seja mais fértil e também aberto a mudanças. Por isso, entendo que essa busca por jovens advogados se reflete em um direito participativo e colaborativo, que oferece mais autonomia e comprometimento aos jovens profissionais, permitindo que eles participem das tomadas de decisões, novos projetos e negociações, adquirindo assim mais conhecimento”, afirma.

Helena Menezes, outra jovem advogada de 34 anos, busca a empatia e o desenvolvimento de suas habilidades. A advogada do Fragata e Antunes Advogados atua no escritório há 11 anos e foi recentemente promovida a sócia.

“Como nova sócia, espero poder desenvolver minhas habilidades, inclusive interpessoais, para que eu possa resolver problemas com eficiência. Espero poder satisfazer as necessidades do cliente, melhorando minhas características pessoais e meu profissionalismo, e que, acima de tudo, tenha possibilidades reais de desenvolvimento”, diz.

Vinícius Fochi, de 27 anos, formado há apenas dois anos, é advogado criminalista da Damiani Sociedade de Advogados e também busca uma vaga no mercado que auxilie em seu crescimento profissional, privilegiando questões que ajudem no aprimoramento técnico-jurídico e acadêmico.

“O mercado jurídico é extremamente competitivo e, como profissionais, precisamos estar em constante evolução. Mesmo assim, é de extrema importância que os escritórios estabeleçam parâmetros específicos para que o jovem profissional cresça dentro da instituição, apresentando um plano de carreira. Além disso, é preciso que a responsabilidade seja um motor de crescimento, ou seja, que o trabalho árduo impulsione o desenvolvimento pessoal e profissional do jovem advogado”, avalia.

A visão dos CEOs e managing partners

Para Alfredo Zucca, diretor presidente do ASBZ Advogados, desde já é necessário mudar a forma como é feita a conversa e o trabalho com os jovens advogados, porque eles têm, hoje, outras prioridades. “Eles querem viver uma experiência. Se dissermos: – vai ter que trabalhar 15 horas por dia para ser alguém na vida – eles vão embora. Não é isso que os jovens querem mais. Isso é diferente da forma como fomos incentivados e motivados lá atrás”, afirma. 

O advogado defende que a motivação nos tempos atuais tem relação com mostrar o valor daquilo que o jovem faz, tornar a experiência dele dentro de um ambiente de trabalho mais rica e atrativa, para que haja desenvolvimento e para que ele, aos poucos, vá deixando com que seu potencial aconteça. 

“Até porque, hoje a perspectiva de vida nossa aumentou muito. Se há 30 anos falávamos que aos 50, 60 anos, estava chegando ao final da carreira, hoje nessa idade podemos estar no começo de uma nova carreira. Então, o jovem não tem mais essa pressa de querer conquistar tudo a qualquer custo, muito rapidamente, porque sabe que a jornada é longa”, diz. 

Na avaliação do especialista, o principal erro cometido na indústria jurídica por gestões mais tradicionais e clássicas é não querer entender o jovem e tentar mudar a forma como ele age e pensa, manter uma cultura de mercado que era exigida há 30 anos, por exemplo. “O que vale hoje é a qualidade da experiência, a qualidade do vínculo”, avalia.

Apesar dos avanços, essa é uma jornada lenta, que depende de iniciativas e oportunidades. E cabe aos mais velhos e líderes, de forma estratégica, auxiliar e abrir caminhos de mudanças, fomentando iniciativas e ações de diversidade e inclusão.

“Em nosso modelo de negócio, onde a advocacia é artesanal e sob medida, a figura do gestor estratégico é imprescindível para o desenvolvimento e motivação dos advogados mais jovens a fim garantir o padrão de excelência na prestação de serviços. O gestor tem a missão de guiar os passos do jovem profissional rumo ao objetivo traçado, seja pela melhor experiência na aplicação prática do Direito, seja incentivando a sua capacitação técnica contínua por meio da participação em demandas desafiadoras”, explica André Damiani, sócio fundador do Damiani Sociedade de Advogados.

“O gestor atua na promoção da autoconfiança e da autonomia do jovem profissional, preparando-o para assumir responsabilidades cada vez maiores, sempre em conformidade com as exigências do negócio, preservando e perpetuando o padrão de excelência do trabalho”, afirma.

Mas boa parte das firmas faz pouco para promover o desenvolvimento desses advogados. Existe a crença, segundo os especialistas, de que muitos deles já possuem todo o conhecimento necessário para serem bem sucedidos.

Apesar da quantidade de novos profissionais que chegam ao mercado todos os anos, ainda hoje uma minoria de escritórios de advocacia se esforçam para desenvolver o potencial desses jovens com valores mais voltados ao que pensa a nova geração. E a grande maioria ainda segue o processo típico de avaliação e compensação. o estão relacionadas ao conhecimento jurídico: soft skills e habilidades emocionais, que costumam fazer a diferença quando questões complexas e delicadas devem ser resolvidas.

“Os jovens hoje são muito mais intensos e instáveis. É preciso trabalhar a resiliência dentro desse contexto, onde não existe mais segregação de profissional e pessoal. É tudo uma coisa só. O gestor tem de cuidar, de entender o que está acontecendo com a pessoa fora do ambiente de trabalho, ter uma conexão que se constrói no dia a dia, sem imposição. Essa conexão é construída com respeito, conversa e relacionamento diferenciado”, analisa Alfredo Zucca.

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Desmistificando o Direito Penal Econômico e sua aplicação

Você já ouviu falar em Direito Penal Econômico? Quando falamos sobre Direito Penal, uma imagem de crimes violentos, como assassinatos, roubos e sequestro, vem à mente de boa parte das pessoas. De outro lado, são poucas as que pensam em delitos contra a ordem econômica, o sistema financeiro, as finanças públicas, as relações de trabalho, a ordem tributária e, até mesmo, o meio ambiente, certo?

Por isso, elaboramos este artigo para explicar um pouco o que é o Direito Penal Econômico e como se dá a sua aplicação. 

O que é Direito Penal Econômico?

De uma forma bem direta, esqueça a ideia de que o Direito Penal Econômico é uma ramificação do Direito Econômico, porque não é.


O Direito Penal Econômico é um conjunto de normas jurídico-penais, cujo objetivo é defender a ordem socioeconômica

Ele surgiu no início do século XX, resultante de crises econômicas e guerras. Foi basicamente uma tentativa desesperada do Estado em combater o descontrole econômico.

O que é um delito econômico?

O conceito de crime ou delito econômico, em sentido amplo, consiste na infração à Lei penal capaz de colocar em risco a ordem ou a vida econômica do Estado.

Você conhece a expressão “crimes de colarinho branco”? Pois bem, são estes os delitos que são objeto do Direito Penal Econômico.

Essa expressão, cunhada em 1939, foi utilizada inicialmente para fazer referência aos crimes praticados por pessoas consideradas importantes e da chamada “alta sociedade”, no âmbito de suas  atividades profissionais.

Por exemplo, temos na legislação brasileira os crimes contra o sistema financeiro nacional, tratado pela lei n° 7.492/86 e os crimes contra a ordem econômica e tributária, que se encontram descritos na lei n° 8.137/90.

Conhecendo o alvo dos delitos econômicos

Contra quem são praticados os crimes financeiros? Essa é fácil de responder. O alvo do delito econômico é, em última análise, a economia de livre mercado. Dessa forma, o Direito Penal Econômico tem a finalidade de proteger a própria estrutura econômica do país.

Nessa linha de ideias, vejamos como a Ordem Econômica está descrita na Constituição Federal:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: 

I – soberania nacional; 

II – propriedade privada; 

III – função social da propriedade; 

IV – livre concorrência; 

V – defesa do consumidor; 

VI – defesa do meio ambiente; 

VII – redução das desigualdades regionais e sociais; 

VIII – busca do pleno emprego; 

IX – tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte.

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. – Constituição Federal.  

Com efeito, os crimes praticados contra a ordem econômica resultam em sérios danos à sociedade. Isso porque, além da perversão das relações privadas do mercado financeiro, os valores desviados, roubados ou sonegados, impactam diretamente na organização das finanças públicas,  em prejuízo ao desenvolvimento econômico da nação e, por consequência, à população do país.

Aplicação direta do Direito Penal Econômico 

Vamos pensar nos crimes de sonegação fiscal que, infelizmente, acontecem com frequência. Esse tipo de crime é responsável por lesar os cofres públicos em bilhões de reais, os quais deveriam ser destinados a investimentos necessários à população. 

O Direito Penal Econômico é o regramento que busca coibir e reprimir esta prática, evitando, assim, que ela afete o sistema tributário nacional. Além disso, prevê mecanismos de redução de danos ao erário que levam ao pagamento do tributo sonegado em troca da extinção da punibilidade.

Ainda, o Direito Penal Econômico não atua apenas sobre as relações macroeconômicas que impactam diretamente na administração pública, mas também resguarda a ordem econômica por meio da tutela das relações privadas no âmbito da microeconomia. 

Por exemplo, as relações de consumo (compra e venda, exposição à venda, divulgação, precificação etc., de produtos e serviços; relação entre oferta e procura, entre outros aspectos).

Para que se tenha uma noção mais detalhada sobre o Direito Penal Econômico, trouxemos  o art. 7 da lei n° 8.137/90, que é uma das leis desta área específica do Direito Penal. 

Acompanhe uma lista de ações que configuram crimes contra as relações de consumo que atingem, de forma indireta, a ordem econômica:

Art. 7° Constitui crime contra as relações de consumo:

I – favorecer ou preferir, sem justa causa, comprador ou freguês, ressalvados os sistemas de entrega ao consumo por intermédio de distribuidores ou revendedores;

II – vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que não corresponda à respectiva classificação oficial;

III – misturar gêneros e mercadorias de espécies diferentes, para vendê-los ou expô-los à venda como puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades desiguais para vendê-los ou expô-los à venda por preço estabelecido para os demais mais alto custo;

IV – fraudar preços por meio de:

a) alteração, sem modificação essencial ou de qualidade, de elementos tais como denominação, sinal externo, marca, embalagem, especificação técnica, descrição, volume, peso, pintura ou acabamento de bem ou serviço;

b) divisão em partes de bem ou serviço, habitualmente oferecido à venda em conjunto;

c) junção de bens ou serviços, comumente oferecidos à venda em separado;

d) aviso de inclusão de insumo não empregado na produção do bem ou na prestação dos serviços;

V – elevar o valor cobrado nas vendas a prazo de bens ou serviços, mediante a exigência de comissão ou de taxa de juros ilegais;

VI – sonegar insumos ou bens, recusando-se a vendê-los a quem pretenda comprá-los nas condições publicamente ofertadas, ou retê-los para o fim de especulação;

VII – induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária;

VIII – destruir, inutilizar ou danificar matéria-prima ou mercadoria, com o fim de provocar alta de preço, em proveito próprio ou de terceiros;

IX – vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo;

Pena – detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa

Pois bem, como comentado anteriormente, o Direito Penal Econômico se propõe a tutelar inclusive as relações microeconômicas (como as relações de consumo). O objetivo é prevenir crises econômicas que se iniciam pela repetição irrefreada desses tipos de condutas que podem levar a um desequilíbrio do mercado. 

Como se vê, são crimes não tão visíveis, como um roubo no meio da rua, ou um caso óbvio de injúria racial direta, pelo contrário, “parecem não existir”. No entanto, seu resultado é tão ou mais danoso. 

Por fim, o mais penoso meio de controle e autoridade no convívio em sociedade, que é o Direito Penal, teve que se direcionar para a proteção da ordem econômica para inibir práticas desse tipo. 

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CRIAÇÃO DE TIPO PENAL NÃO ACABA COM A VIOLÊNCIA CONTRA MULHER

A sócia Mayra Maloffre Ribeiro Carrillo e a advogada Lucie Antabi comentam acerca do novo tipo penal de violência doméstica psicológica inserido no Código Penal

A cada dois minutos uma mulher é agredida no Brasil, levando o país à quinta colocação entre os que mais matam mulheres no mundo.[1] Além disso, de acordo com o levantamento realizado pelo Datafolha em fevereiro de 2020, por encomenda da ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) para avaliar o impacto da violência contra as mulheres no Brasil, mais da metade delas (52%), mesmo sofrendo violência física ou psicológica, não denunciou o agressor e tampouco procurou ajuda.[2]

Com o fim de combater o significativo aumento de casos de violência doméstica nos últimos tempos, em junho de 2020 o Conselho Nacional de Justiça, em parceria com a Associação dos Magistrados Brasileiros, criou o Programa Sinal Vermelho.

Trata-se de uma campanha que visa disseminar a ideia de que uma mulher, vítima de violência doméstica, desenhe um “X” — de preferência na cor vermelha — em sua mão ou em outro lugar perceptível, para que um terceiro possa acionar a polícia em nome da vítima. [3]

A campanha virou lei, sancionada em 28.07.2021, pelo presidente Jair Bolsonaro (Lei 14.188/2021), trazendo algumas inovações legislativas no combate à violência contra a mulher, dentre elas o aumento de pena no crime de lesão corporal contra mulher, por razões da condição de sexo feminino, e, enfim, a inserção do tipo penal de violência psicológica contra mulher no Código Penal. Vale destacar que as mulheres estão suscetíveis a diversas formas de violência, dentre elas a violência física, a manipulação financeira e emocional, bem como os abusos psicológicos, sendo esta a forma de violência mais presente.

Dando ênfase à inserção do crime de violência psicológica contra a mulher no Código Penal, assim restou tipificado no artigo 147-B: “Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação.”

Desse modo, aquele que causar dano emocional que perturbe ou prejudique o desenvolvimento mental, degrade ou controle ações e comportamentos poderá ser responsabilizado penalmente. Isto apenas na hipótese de o infrator praticar o crime com o fim específico de causar dano emocional à vítima.

Ressalta-se, ainda, que a ocorrência do crime deve ser baseada em razões de gênero. Ou seja, não basta o crime ser praticado contra mulher no âmbito doméstico ou familiar, exige-se que a motivação do acusado seja de gênero, ou que a vulnerabilidade da ofendida seja decorrente da sua condição de mulher.

No entanto, tendo em vista que o crime deixa vestígios — o próprio dano emocional à saúde da mulher —, necessário se faz a comprovação da materialidade, por meio da realização de exame de corpo de delito, mais precisamente, de perícia psicológica.  

Evidentemente, a inserção do crime de violência psicológica contra a mulher no Código Penal é uma forma de evitar que o agressor saia ileso, assegurando-se o direito à liberdade individual da vítima. No entanto, é notório que tão somente a inovação legislativa não afasta a necessidade de políticas públicas tanto para evitar a agressão quanto para auxiliar e incentivar as mulheres, vítimas de violência, a denunciar e procurar ajuda, tendo em vista que muitas vezes diante da vulnerabilidade, do medo e da ameaça estas se quedam inertes.

*Mayra Maloffre Ribeiro Carrillo, sócia do Damiani Sociedade de Advogados, é advogada criminalista, especializada em Direito Penal Econômico e Europeu

**Lucie Antabi é advogada criminalista no Damiani Sociedade de Advogados


[1] Pesquisa realizada pelo Fórum Nacional de Violência Pública https://www.saopaulo.sp.gov.br/ acesso em 02.09.21

[2] https://forumseguranca.org.br/ Acesso em 30.08.2021

[3] A identificação do sinal poderá ser feita pessoalmente em repartições públicas e entidades privadas que participem do programa. E atendentes dessas organizações poderão encaminhar a vítima ao sistema de segurança pública.

Assédio sexual e o compliance de gênero

O sócio fundador André Damiani e a advogada Flávia Bortolini foram destaques no Estadão.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) define assédio sexual como comentários impróprios, convites impertinentes, insinuações, atos e contatos físicos forçados, dentro ou fora da empresa. Muitas vezes a prática envolve relações hierárquicas e vem acompanhada de coação, chantagem, humilhação, insultos e intimidação. A prática é tão comum quanto se imagina, e pode ter efeitos catastróficos sobre a vida de colaboradores e corporações – como ficou claro recentemente com denúncias ao presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), por comportamentos impróprios. Para proteger funcionários e evitar danos materiais e imateriais a instituições e empresas, é preciso desenvolver programas de integridade específicos: o compliance de gênero.

Pesquisa elaborada pela consultoria de inovação social Think Eva, em parceria com a rede social LinkedIn, mostra que cerca de 50% das mulheres afirmam ter sofrido assédio no trabalho. Porém, só 5% denunciaram seu agressor. A conhecida omissão e indiferença reinantes no ambiente corporativo são as maiores barreiras à investigação, e raramente a vítima formaliza uma reclamação no RH da empresa. Com toda essa insegurança incutida nos colaboradores, diversas empresas contemplam a bomba-relógio da crise institucional.

O compliance de gênero tem por objetivo a definição de regras para promover a igualdade entre profissionais de uma empresa, oferecendo a mulheres um ambiente seguro, sem discriminação e com políticas firmes antiassédio. Dentre as boas práticas adotadas, um canal efetivo de denúncias é fundamental. Trata-se de um meio pelo qual os colaboradores podem comunicar fatos considerados ilegais, tanto para assédio quanto para desvios de verba, por exemplo. Essa ferramenta permite que os funcionários falem com segurança sobre irregularidades cometidas dentro da instituição garantindo a segurança do colaborador, inclusive, com a possibilidade de uma denúncia anônima.

Após o recebimento da denúncia, é fundamental que o assunto seja tratado com seriedade e cautela. Além de se acolher a vítima, deve haver investigação transparente. Colocar panos quentes na situação, por receio da repercussão e desgaste, pode ser ainda mais prejudicial, já que 1 a cada 6 mulheres se desligam da empresa justamente para não mais conviverem com o assediador. Ou seja, a empresa, além de lidar com uma sensação de impunidade perante os demais colaboradores, está sujeita a perder talentos. Além do prejuízo humano, a empresa está suscetível a condenações judiciais que irão repercutir no bolso, já que o funcionário pode demandar numa ação trabalhista.

Além disso, a conscientização é fundamental. Diversas consultorias são especializadas em treinamentos de prevenção ao assédio organizacional, todavia, mesmo que não haja a contratação de consultores externos, RH e gestores devem estimular boas práticas no ambiente de trabalho, transmitido segurança e respeito quando um funcionário venha a expor suas angústias. Além disso, a correta implementação de códigos de ética e conduta reforçam o comprometimento de uma empresa em combater o assédio. Reconhecer os sinais, acolher as vítimas e punir os culpados são atitudes fundamentais dentro de uma empresa porque, afinal, todos são responsáveis por combater o assédio sexual.

No Brasil, a legislação elenca diversos crimes contra a dignidade sexual, cujas penas seguem a lógica da proporcionalidade: quanto mais danosa a ofensa, mais anos de cadeia. Em 2018 sancionou-se a capitulação do crime de importunação sexual, buscando-se preencher lacuna punitiva no tocante ao enfrentamento da importunação “menos grave” do que o crime de estupro. O crime de assédio sexual, no Brasil, tem outro enfoque: a superioridade hierárquica no ambiente de trabalho a serviço da obtenção de vantagem ou favorecimento sexual, por meio do constrangimento da vítima. A pena varia de 1 a 2 anos de prisão, configurando-se mesmo na ausência de contato físico comprovado.

Leia na íntegra.

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