É crime inflacionar o preço da água em meio a tragédia no litoral de SP? 

Ganhou repercussão nacional o aumento exorbitante do valor das mercadorias comercializadas no litoral norte de São Paulo, logo após a região haver sido atingida severamente pelas fortes chuvas de fevereiro de 2023; contabilizando-se 65 pessoas mortas.

Não é crime o comerciante vender o litro da água ao preço de R$ 100,00. Mas o tema merece uma reflexão sobre a ótica da moral e da lei.

Segundo a lógica do capitalismo, em princípio, pode o comerciante atribuir a sua mercadoria o valor que bem entender, vigorando a lei da oferta e da procura, ou seja, quanto maior a escassez do produto no mercado, maior será o preço da mercadoria. 

Ocorre que numa situação emergencial, com a população ilhada e à mercê da boa vontade do poder público, não vigora o livre mercado porque os cidadãos são obrigados a consumir gêneros de primeira necessidade (água, alimento, higiene pessoal etc.); compradores coagidos não tem liberdade…

Bem por isso, o Estado não só pode como deve intervir no combate ao superfaturamento dos produtos, afinal, é obrigação do Poder Público assegurar aos indivíduos, severamente afetados pela tragédia ocorrida na região, o acesso regular e justo aos produtos necessários para a sua sobrevivência.

Evidente que não se deve menosprezar o empenho do comerciante que, diante da tragédia ocorrida, se dispõe, pelos próprios meios e riscos, a levar mercadorias para região, podendo sim haver uma certa valorização da mercadoria em razão do esforço e custo para o transporte do produto. 

No entanto, isso não representa “carta branca” para comerciantes, locais ou de fora da região, lucrarem de forma inescrupulosa em face da vulnerabilidade dos cidadãos.

Em síntese, muito embora não possamos falar em crime, o Estado deve atuar com base no Código de Defesa do Consumidor, que garante ao cidadão a proteção contra toda e qualquer prática abusiva, nos termos de seu artigo 6, inciso IV. 

De mais a mais, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 39, inciso X, considera prática abusiva “elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços”, ainda mais diante de uma calamidade pública.

Em tempos de crise, fica a mensagem: precisamos enquanto sociedade nos unir, afinal, como bem disse o escritor Franz Kafka: “A solidariedade é o sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana”.

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