O Direito Penal de emergência é um instrumento autoritário de política criminal que aposta no enrijecimento das leis penais como forma de responder a casos que ganham a atenção da população.
Como consequência, esses casos acabam causando grande repercussão social, fenômeno este potencializado pela pressão midiática.
Fruto do imediatismo, com objetivo de atender o clamor popular e, por consequência, angariar capital político, o Direito Penal de emergência representa uma grave ameaça a direitos e garantias fundamentais.
Isso porque as medidas adotadas são desproporcionais, autoritárias e inadequadas ao fim que se propõem, qual seja, a redução da criminalidade.
Em outras palavras, as medidas adotadas têm efeito meramente simbólico, ou seja, atendem à demanda da opinião pública, aplacando os ânimos punitivistas, mas não produzem qualquer resultado útil na real solução do problema.
No Brasil, é exemplo do Direito Penal de emergência a criação do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) pela Lei 10.792/03.
Essa legislação foi elaborada em resposta à pressão midiática e política que decorreu de rebeliões em presídios em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Assim, o RDD inaugurou uma nova política penitenciária de exceção, marcada pelo confinamento extremo, consolidando-se como uma das formas de pena mais cruéis e degradantes no Brasil.
No entanto, ao contrário do que pensou a opinião pública, fomentada pela mídia, as causas para do problema a serem enfrentadas não eram ausência de legislação ou a previsão de dispositivos brandos.
A verdadeira causa é a política criminal de encarceramento em massa adotada, que lota nosso sistema carcerário, gerando um “Estado de Coisas Inconstitucional”, como bem reconheceu o Supremo Tribunal Federal (ADPF nº 347/DF).
Dessa forma, ao revés do que pretendeu o legislador emergencista, crise penitenciária brasileira, que representa um problema histórico, não apenas deixou de ser enfrentada como permanece até hoje, agravando-se cada vez mais.
Isto é, mesmo após quase 20 anos de vigência da lei mais dura, o problema continua sem solução.
Também, não podemos deixar de citar a criação da Lei dos Crimes Hediondos.
A legislação foi aprovada em caráter de urgência após notícias que causaram comoção social, mas que em nada contribuiu para a diminuição dos crimes violentos. Por exemplo, o caso de sequestro do empresário Abílio Diniz e do publicitário Roberto Medina, no início da década de 90.
Lei Maria da Penha e Lei do Feminicídio
O mesmo se diga a respeito das diversas legislações criadas com a finalidade de conferir maior proteção à mulher.
A despeito da dos mais de 16 anos de vigência da famigerada Lei Maria da Penha, bem como da recém-criada Lei do Feminicídio, os números da violência de gênero não param de crescer. Ou seja, são exemplos do Direito Penal de emergência.
Isso ocorre porque o Direito Penal não é instrumento de transformação social. Portanto, não tem aptidão para promover as mudanças estruturais necessárias, seja à redução da criminalidade violenta em uma sociedade desigual, seja à redução da violência de gênero no seio de uma sociedade eminentemente patriarcal.
Assim, o que de fato acontece é que a resposta imediatista promovida pelo Direito Penal de emergência gera uma falsa sensação de resolução da questão. Isso acaba impedindo uma discussão aprofundada do tema em busca de uma solução verdadeira e, por consequência, agravando o problema.
É como jogar a poeira para baixo do tapete, a casa parece limpa, enquanto, na verdade, a sujeira continua se acumulando.
Na era da tecnologia, essa situação é ainda mais grave, uma vez que a (des)informação trafega de maneira muito veloz e os veículos de comunicação ganham um papel especial na expansão do Direito Penal de emergência. Visto que inflamam a opinião pública com programas e notícias sensacionalistas, pressionando, ainda mais, os Poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário).
Não há fórmulas mágicas. O Direito Penal de emergência não pode ser instrumento de política criminal do Estado, na medida em que o mero endurecimento da lei penal não promove o enfrentamento ao problema.
O Direito Penal deve ser norteado por estudos científicos e não pela ânsia imediatista da opinião pública.
Vinícius Fochi
Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista em Direito Penal Econômico pelo Instituto Brasileiro de Ciência Criminais – IBCCRIM
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